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Opinião|Rixa

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Com um ano de atraso assisti aos oito episódios de Feud: Joan e Bette, minissérie em oito capítulos , criada por Ryan Murphy, Jaffe Cohen e Michael Zam sobre a rivalidade entre as atrizes Joan Crawford e Bette Davis.

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Foi bom para dar uma desopilada daquela farsa trágica de ontem. Meu Deus, não sei como aquela gente encosta a cabeça no travesseiro e dorme. Se é que dorme. Enfim.

Tem um aspecto nessa minissérie da Fox sobre o qual já haviam me advertido: é viciante. Ao contrário das farsas jurídicas, estas nos fazem quase pular de prazer, e mal podemos esperar pelo capítulo seguinte; aquelas são de contorcer de náusea e nos fazem desejar estar em outro planeta, anos-luz longe daqueles soturnos protagonistas.

Há um lance aí, da narração, sobre a qual os norte-americanos são especialistas. Sabem como ninguém apurar um roteiro, lapidá-lo e depois colocá-lo em imagens de ritmo envolvente.

Claro, o elenco é fundamental. E Susan Sarandon como Bette Davis e Jessica Lange como Joan Crawford estão impagáveis. Mas, como esquecer de Alfred Molina como Robert Aldrich, Judy Davis como a jornalista de fofocas Hedda Hopper e Stanley Tucci como Jack Warner, o produtor sem qualquer princípio? Sem falar de Mamacita, interpretada por Jackie Hoffman.

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Mamacita, para quem não lembra, era a auxiliar de Joan Crawford e se manteve no cargo por 14 anos. Até ir embora, cansada de ter a cabeça usada como alvo de objetos variados que a patroa atirava sobre ela em crises de fúria, ou de bebedeira, ou ambas.

A série, acho eu, tira seu encanto desse encontro de personalidades fortes. Duas divas geniosas, para contracenar em O que Terá Acontecido com Baby Jane (1962), sob direção de Robert Aldrich. Este estimulava a já intensa rivalidade entre elas porque achava (como o produtor, Warner) que assim dariam o melhor de si. Pode até ser. Mas estimulá-las para a guerra significava estar permanentemente sentado sobre um barril de pólvora com um charuto aceso nas mãos.

A tática explodiu dois anos depois quando tentaram repeti-la em Hush...Hush, Sweet Caroline e Crawford simplesmente sabotou a filmagem, dizendo-se doente. Até ser afastada e substituída por Olivia de Havilland. Mas o filme esteve por um fio. 

Enfim, Feud é um magnífico olhar sobre a intimidade da indústria de sonhos de Hollywood e dos custos humanos que ela acarreta. O ego e a agressividade das divas, mas também sua insegurança patológica e a via trágica que tomam ao envelhecer e sentir que estão sendo descartadas. A prepotência dos produtores e a venalidade da imprensa de celebridades. A corda bamba dos diretores, tendo de satisfazer as ordens de quem paga, as exigências de quem atua e suas próprias ambições autorais.

Vida difícil, mas também fascinante. E, diferentemente de outras farsas da vida, esta mostra-se humana, demasiado humana.

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Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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