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Uma geléia geral a partir do cinema

Resiste, Bortolotto

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Ainda não abri os e-mails e, portanto, não sei se vocês postaram algum comentário sobre os posts de ontem. Quero acrescentar alguma coisa, não sei exatamente o quê, sobre Mário Bortolotto. Vocês já devem saber que o Bortolotto resistiu a um assalto na madrugada de sábado e foi baleado. Três ou quatro tiros, um bem perto do coração. Ele está na UTI, em estado grave, mas até onde sei seu organismo é forte e ele tem resistido bravamente. Foi o que me disse a médica, quando me informou de que eu tinha de operar o coração, há pouco mais de um ano. Foi tudo muito rápido, eu não sentia nada e ela me disse que era tempo de eu ajudar meu coração, porque ele tinha a força de um cavalo e havia feito muita coisa sozinho. Não sei exatamente por quê, mas aquilo me fez um bem enorme saber que, a despeito de outras fraquezas - que todos temos -, o coração é forte (e espero que também generoso). Conheço o teatro do Bortolotto, assisti - claro - ao filme que Reinaldo Pinheiro adaptou de 'Nossa Vida não Vale Um Chevrolet', que no cinema virou 'Nossa Vida não Cabe num Opala', porque não houve jeito de o diretor conseguir a liberação do uso da marca. Acho que ficou melhor. O Opala, o carro, vale menos do que o Chevrolet e a metáfora, o valor da vida humana numa sociedade selvagem, fica mais urgente. O que quero dizer é que nunca falei com o Bortolotto, nem quando o filme foi lançado, até porque ele não gostou muito da adaptação e, inclusive, bateu boca, em seu blog, com o roteirista Di Moretti. Mas eu admiro e respeito o trabalho do cara e me toca esse tipo de coragem suicida. Sei lá o que faz uma pessoa reagir a um assalto. Eu próprio já reagi, já me engalfinhei com um assaltante e o cara deve ter ficado tão surpreso, dadas as minhas condições, que até me saí razoavelmente bem - apenas um corte superficial (ele tinha uma faca). Foi em Porto, eu já tinha sido assaltado antes, uma semana antes ou coisa que o valha, e o sangue ferveu - 'De novo, não!' Qualquer pessoa sensata vai dizer que não se reage, é verdade, mas o não reagir não é garantia de que o assaltante não vai te dar um tiro, mesmo assim. Antigamente, a arma era usada para intimidação. Hoje, os caras disparam mesmo. Não sou frequentador da Praça Roosevelt - tinha um amigo, há muitos anos, quando cheguei a São Paulo, que morava ali -, mas me preocupa que o esforço para reerguer aquela área seja colocado em risco. E a vida do Bortolotto vale mais que um Chevrolet. É curioso que essa violência não tenha ocorrido quando as calçadas eram liberadas e os bares da área podiam colocar as mesas ali fora. Aliás, não sei por que a prefeitura cassou a liberação. Imagino que tenha sido para preservar o silêncio dos moradores - cujos prédios valorizaram justamente com o burburinho, ou me engano? Vi outro dia no 'Jornal da Tarde' uma matéria muito interessante, sobre as consequências da lei antifumo. Quem mora perto de baladas não aguenta mais, porque as pessoas saem para fumar e aí ficam conversando na calçada e, quando abrem ou fecham a porta, o som vaza. Imagino que, dependendo do lugar, a menos que haja segurança reforçada, esses momentos de entra/sai também criam um flanco que pode beneficiar a ação de criminosos. Longe de mim, que detesto cheiro de cigarro, ir contra a lei. Só estou tentando entender o que ocorre. E acho graça, isso acho graça, sim, que cada vez mais os espetáculos de teatro mostrem atores fumando. Ontem, foi a Imara Reis na peça 'O Ano do Pensamento Mágico', de Joan Didion. Não me lembro, sinceramente, se antes tanta gente fumava em cena. Como era liberado, a gente nem reparava. Agora, que virou transgressão, salta aos olhos. Belo problema, hein? Cumprir a lei num espetáculo seria censura?

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