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Uma geléia geral a partir do cinema

O Oscar, argh!

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Fiquei até de madrugada na redação do Estado, atualizando textos, ajudando no fechamento para as duas edições do Caderno 2 de hoje que tivemos durante a cerimônia de transmissão do 79º Oscar. O prêmio é sempre polêmico, mas eu confesso que nunca achei o Oscar tão massacrante. Não tem nada a ver com a dupla vitória de Martin Scorsese, como melhor diretor e filme (Os Infiltrados). Esperava a primeira, fiquei um pouco surpreso com a segunda (preferia Pequena Miss Sunshine), mas faz parte. Achei a cerimônia longa demais - quatro horas não é brincadeira -, mas o que me matou foi o descaramento. Cinismo, cara-dura, dêem o nome que quiserem. Na abertura da festa, Ellen De Generes, chata e pouco engraçada, mas com algum tempero político, exaltou a internacionalização como a grande conquista do Oscar de 2007, para os melhores do cinema em 2006. Num país corroído pela paranóia isolacionista, como os EUA de George W. Bush, essa abertura para o outro é uma coisa importante, mas não foi sacramentada por nenhuma grande vitória que confirmasse que aquilo não era só en cenação. Era encenação - um afago no mercado externo, porque, no frigir dos ovos, o Oscar dos hispanos na verdade não teve abertura para o novo e muito menos para o cinema íbero-americano. Guillermo Del Toro, com Labirinto do Fauno, terminou sendo o campeão, com quatro prêmios, mas não ganhou o único que realmente importava - o de melhor filme estrangeiro. Babel, do qual nem gosto muito, foi o grande derrotado - teve um prêmio de consolação, para melhor trilha -, mas, para mim, pelo menos, foi duro ver Adriana Barraza perder o prêmio de coadjuvante para Jennifer Hudson. Não tenho muita paciência com essa coisa de Cinderela, de patinho feio que vira cisne. Não gostei do prêmio, nem dela, como também não gostei do discurso do Forest Whitaker, com aquela história do menininho pobre do Texas. E vou morrer sem que me convençam de que ele era o melhor. Foram histórias 100% americanas e o Oscar, afinal, é um prêmio deles. Podem fingir abertura, mas não vão além disso. 'Pretend' - é o que fazem. Perdi de vez a ilusão de que os tais envelopes lacrados são invioláveis e ninguém sabe nada - só o funcionário que fecha o lacre. Há tempos achava curioso que Norma Aleandro, Sophia Loren e Penelope Cruz entregassem o prêmio de melhor filme estrangeiro a diretores de seus países (e até nos quais trabalhavam). Já pensaram a saia justa, se os caras não ganhassem? Este ano, quando vi dois atores de língua inglesa apresentando o prêmio para o melhor filme estrangeiro, aproveitei e fui ao banheiro porque sabia que não haveria discurso de agradecimento de Guillermo Del Toro. Não tinha dúvida de que Scorsese ganharia, mas já pensaram se não ganhasse - o que fariam Coppola, Spielberg e Lucas convocados para entregar o prêmio ao amigo de quase 40 anos? Ah, sim, o Lucas nunca ganhou e, portanto, estava ali para o caso de dar alguma zebra. Não - confesso que me irritei na maior parte do tempo. Gostei do clip que precedeu o Oscar de melhor roteiro adaptado, mas por que separar o Oscar de roteiro original? Adorei a visão da construção da América por Michael Mann. Foi a melhor coisa. Me emocionei com os mortos do ano. Alguns, a maioria, já sabia, mas confesso que as mortes da roteirista Jay Presson Allen e do diretor Vincent Sherman me haviam passado despercebidas. Gostei do tributo a Al Gore, mas a ecologia é uma causa tão politicamente correta e tão necessária à própria sobrevivência da Terra que só louco (Bush filho?) para continuar com sua política suicida rumo ao aquecimento global definitivo do planeta. A coisa mais séria que Ellen disse foi, en passant, logo no começo. Sem gays e negros, não existiria o prêmio da academia. A própria presença de Ellen, fazendo metaforicamente aquela faxina no Kodak Theatre, fez parte da encenação. Sacha Baron Cohen sabia disso. Convidado a apresentar o Oscar, declinou. Já pensaram em Borat em cima daquele palco? Não ia combinar com a meia-abertura que a festa desta madrugada tentou impor à gente.

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