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Uma geléia geral a partir do cinema

O adeus a Jane Wyman

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Saí à tarde do jornal para assistir à cabine de Fido, que estréia na sexta, e nem tive tempo de postar alguma coisa sobre a morte de Jane Wyman. Jane quem? Wyman. Quando comentei no jornal a morte da ex-mulher de Ronald Reagan, alguém fez a clássica pergunta - mas ela ainda estava viva? Jane morreu aos 93 anos, no isolamento de sua casa no deserto, em Palm Springs, de onde só saiu nos últimos anos - há uns dez pelo menos - para o enterro de sua filha com o ex-presidente americano. Reagan não foi. Estava terminal, vítima de Alzheimer. Jane Wyman compareceu, apoiada numa bengala. Pouca gente deve lembrar-se dela, mas Jane trabalhou com diretores importantes. Foi a mulher de Ray Milland em Farrapo Humano, de Billy Wilder, que ganhou os principais Oscars de 1945. Ela também recebeu seu prêmio, em 1948, pelo papel como a muda que era estuprada em Johnny Belinda, de Jean Negulesco. Jane trabalhou, entre outros diretores, com Clarence Brown (Virtude Selvagem), Alfred Hitchcock (Pavor nos Bastidores) e, duas vezes, com Douglas Sirk (Sublime Obsessão e Tudo o Que o Céu Permite). Este último foi o modelo para Longe do Paraíso, de Todd Haynes. Jane fazia viúva negligenciada pelo filho. Logo no começo, ele dá à mãe uma TV (em 1954!), na expectativa de que a novidade supra a carência da pobre mulher. Sirk era um profeta. Previu o que iria acontecer nos anos seguintes, quando a TV invadiu todos os lares dos EUA e do mundo, suprindo carências, alardeando o assustador mundo novo do Grande Irmão. No filme, Jane resiste e tem um caso com o jardineiro, interpretado por Rock Hudson. Todd Haynes misturou tudo - o homossexualismo de Hudson, transferido para o marido de Julianne Moore; o racismo de Imitação da Vida, também transferido para o jardineiro, que em Longe do Paraíso é negro. Jane Wyman não era bonita. Seu mito está ligado a uma fase do cinema, o fim da 2ª Guerra, do glamour dos anos 30. Com ela - e com Dorothy McGuire -, mulheres mais comuns, de um tipo mais prosaico, ganharam um espaço cada vez maior na produção de Hollywood. Hitchcock não tinha muito apreço por Jane e, no livro com a entrevista que deu a Frasçois Truffaut, a responsabiliza pelo fracasso de Pavor nos Bastidores. A personagem tinha de ser sem graça, em oposição ao brilho da estrela de teatro interpretada por Marlene Dietrich. Jane não suportava a idéia de ser suplantada por Marlene e fugia às indicações do mestre, tentando fazer-se bonita. Jane Wyman sempre fez questão de dizer que foi ela quem teve a iniciativa no divórcio de Reagan. Ele engatinhava na política. Era presidente do Sindicato dos Atores. Jane dizia que era muito chato - só queria falar de questões sindicais. Ele se vingou. Em sua autobiografia, Onde Está o Resto de Mim?, Reagan dedica apenas duas linhas a Jane Wyman, com quem foi casado por nove anos e teve dois (três?) filhos. Nos anos 80, ele era presidente dos EUA e ganhava US$ 200 mil anuais. Jane estava aposentada, mas voltou à ativa num papel na série de TV Falcon Crest. Reagan podia ser o homem mais poderoso do mundo, mas por uma temporada Jane embolsou oito vezes mais - US$ 1,6 milhão. Como atriz, ela sempre foi melhor, e teve mais prestígio, que o canastrão de seu ex-marido.

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