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Uma geléia geral a partir do cinema

Imundo, 'Cahiers' falou imundo?

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Roberto postou seu comentário perguntando o que eu achava de 'Cahiers du Cinéma' haver caído matando sobre a vitória de 'Tropa de Elite' no Festival de Berlim, acusando, ou melhor, chamando o filme de José Padilha de imundo. Não me surpreende, mas vamos por partes. Não sou assinante de 'Cahiers', mas sempre que posso compro a revista. O problema, como diz o traveco da peça 'Salmo 91', de Dib Carneiro Neto, é que não estou podendo. Está cada vez mais difícil comprar 'Cahiers' no Brasil. Antes, a revista era importada por uma distribuidora chamada Leonardo Da Vinci (era isso, não?), chegando regularmente às bancas daqui, é verdade que com um pouco de atraso. Na França, 'Cahiers' sai nas bancas no último dia do mês anterior ao assinalado na sua cobertura. Por exemplo, a de abril chegou dia 31 de março às bancas. Aqui, na Av. Paulista, ou na banca da Praça da República (aquela da esquina da São Luiz, que é 24 horas), comprava na segunda quinzena de cada mês. Ou seja, demorava, mas não tanto. Agora, a informação que tenho - e que os próprios caras das bancas me fornecem - é que a distribuição é da Abril. Como ficou muito irregular - às vezes passa um mês e até dois -, vou me poupar de fazer minha interpretação sobre por que isso ocorre. Enfim, é a Abril (mas é mesmo?). Digo isso porque não li o texto de 'Cahiers', mas presumo que seja o de avaliação do Festival de Berlim, que ocorre em fevereiro. Foi na edição de março? Na de abril? Não me surpreende, repito, por dois ou três motivos. O primeiro é que 'Cahiers' nunca gostou do cinema político de Costa-Gavras e não ia perder a oportunidade de cagar mais uma vez na cabeça dele. Se o cinema de Costa-Gavras nos anos 70 era reformista, não revolucionário, o que 'Cahiers' poderia esperar dele? Um segundo motivo é que a revista possui uma agenda muito específica sobre filmes vindos de países do 'Terceiro Mundo', território de pobreza e desigualdade social do qual o Brasil ainda faz parte. 'Cahiers' pode interpretar politicamente as superproduções de Hollywood que aqui são tratadas na pancada, às vezes sem merecer, porque Shyamalan, Spielberg etc., são autores, e críticos, e estão fazendo uma reflexão importante sobre os EUA pós 11 de Setembro. 'Cahiers' percebe isso, mas de um País como o Brasil eles esperam outra coisa. Fazem análises, como direi, direcionadas, baseadas num modelo de cinema que ainda pode ser o de Glauber. 'Cahiers' não ligou muito para 'O Céu de Suely', de Karim Aïnouz, e claro que sua redação ia chamar o Capitão Nascimento de fascista, o Padilha de fascista, considerando 'Tropa de Elite' imundo e/ou vergonhoso. O alegado fascismo do filme do Padilha - não creio que seja - já foi amplamente debatido na imprensa brasileira na época do lançamento. 'Cahiers' está repercutindo, a nível internacional, o que muita gente também andou pensando por aqui. 'Cahiers' e 'Variety', vale lembrar, duas publicações de interesses e características bastante diferenciadas. Muito interessante. Acho que a revista francesa tem muita coisa estimulante - adoro a defesa radical que 'Cahiers' faz de Shyamalan, por exemplo -, mas é preciso dar o desconto em certas circunstâncias. Como esta.

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