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Uma geléia geral a partir do cinema

Enquanto isso, em Hollywood...

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Meu radar funcionou e me fez folhear ontem o 'Aliás', suplemento do 'Estado', encontrando, na mesma página, duas matérias complementares e muito interessantes. Na parte de cima, uma análise da greve dos roteiristas, por Pedro Doria, e, no rodapé, Sérgio Augusto falando sobre a nova cultura dos astros de Hollywood. Os roteiristas querem aumento de salário e participação nos lucros, ameaçando parar a indústria. O cinema é hoje audiovisual, englobando TV, DVD e internet (que os produtrores consideram só ferramenta de divulgação, mas não é). As primeiras prejudicadas são as séries de TV, mas essas eu não vejo, sorry. Não tenho paciência para 'Lost', 'Sex and the City', sinto muito. No cinema, que me interessa mais, achei interessante o desabafo de um roteirista veterano contra 'Cahiers du Cinéma'. Millard Kaufman acha a revista francesa um dos artífices da desvalorização do roteirista, com seu conceito do cinema de autor, que privilegia o papel do diretor. Muito interessante - vamos terminar voltando ao velho debate da crítica Pauline Kael sobre quem é o autor de 'Cidadão Kane', o diretor Orson Welles ou o co-roteirista (Welles tem crédito) Herman Mankiewicz, que, aliás, cito no meu texto para o site da liga de roteiristas, que já deve estar no ar. A greve dos roteiristas pode derrubar Hollywood? Mais do que a pirataria? Lendo o texto de Sérgio Augusto, você chega à conclusão de que, se algo ou alguém, derrubar Hollywood, vai ser a própria fundação desse sistema - o star-system. Há 60 anos, Clark Gable era o astro de maior prestígio da Metro e ganhava US$ 100 mil. Hoje em dia, Tom Cruise embolsou US$ 95 milhões, quase US $ 100 milhões, entre salário e participação nos lucros, por 'Missão Impossível 3'. São poucos, pouquíssimos, os astros que dão retorno de bilheteria na atualidade. A maioria faz sucesso de mídia, mas isso é importante porque mantém o holofote sobre Hollywood e é dessa maneira que o sistema se mantém. Isso, na verdade, começou nos anos 60, quando Elizabeth Taylor, não querendo fazer Cleópatra, pediu um salário impensável na época - US$ 1 milhão de dólares - e ainda um diretor de sua confiança, e a Fox cedeu tudo. Liz continuou ganhando US$ 1 milhão por filme nos anos seguintes e ainda elevou o marido - Richard Burton - ao mesmo patamar, mas nenhum filme da dupla fez sucesso de público (embora, eventualmente, agradassem à crítica). Os astros e estrelas cobram mais hoje, mas valem menos (e têm vida mais curta). Sérgio Augusto cita o caso de Ben Affleck, que fracassou como herói de ação, mas não cita que ele pode estar iniciando uma nova carreira - promissora - como diretor/roteirista, por 'Medo da Verdade', que é um filme crítico de toda essa podridão. Na verdade, tudo faz parte da economia global. Peguem um dado no documentário de Michael Moore, 'Sicko', sobre o sistema de saúde vigente nos EUA. Quanto menos os segurados gastam - os seguros não cobrem muita coisa, mas as pessoas são enganadas e só descobrem quando precisam -, mais os executivos ganham, porque têm participação nos lucros das empresas, e eles aumentam. Peguei outro dado interessante - quando os programas de entrevistas de David Letterman e Jay Leno saíram do ar por falta de roteiros, só Oprah Winfrey continuou no ar, mas ela, a mulher mais rica do show business, não contrata trabalhadores sindicalizados. Pergunta meio ingênua - será que isso tem a ver com o fato de a fortuna de Oprah só aumentar e aumentar? Quando entrevistei Jerry Bruckheimer, ele, considerado o mais poderoso produtor de Hollywood, queixou-se dos custos inflacionados das produções e deixou claro - todo mundo embute custos para poder tirar alguma coisa, em caso de fracasso. Isso é Hollywood? Não, isso é o mundo atual, a economia de mercado. Bem-vindos! Se você não está satisfeito, ou não se 'ajustar', pode ir reservando seu lugar numa marquise do Centro, mas não pense que vai ser fácil, não. O mercado de 'sem-tetos' também está saturado.

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