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Uma geléia geral a partir do cinema

Como assim?

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Cá estou, de volta a casa. Mas ainda com os ecos de Brasília. Na segunda, o Estado publicou entrevista com Lima Duarte explicando porque não foi ao Festival de Brasília para a apresentação de Deserto, último longa da competição. Lima queixou-se da ideologização e partidarização do festival. Disse que os gritos de 'Fora, Temer' iam comprometer o silêncio necessário à fruição da obra de arte. Qual obra de arte? O filme? Ah! Honestamente, achei uma desculpa meio fajuta - não quer ir? Não vai, pronto - e a teria ignorado, não fosse a homenagem a Jean-Claude Bernardet, na noite de encerramento. Jean-Claude recebeu a Medalha Paulo Emílio Salles Gomes, criada para homenagear o centenário do grande mentor do evento - e um dos defensores e teorizadores históricos do cinema brasileiro. Bernardet lembrou que a origem do festival foi uma semana do cinema brasileiro realizada em 1965, há mais de 50 anos, num momento de muita tensão política e ideológica pós-golpe cívico militar. A semana e o festival nasceram para fomentar o debate. Portanto, os que gritaram 'Fora, Temer' - e a inovação do último dia é que, ao mantra tradicional dos dias anteriores, somou-se outro, 'Fora, PMDB' -, não ideologizaram nem partidarizaram o festival porque ele já nasceu assim, com essa vocação de resistir. De volta ao Lima, logo no começo de Deserto, longa de estreia do ator Guilherme Weber como diretor de cinema, o personagem teoriza sobre a arte. A cena é, ao mesmo tempo, grandiosa e banal, pretensiosa e medíocre. O tempo todo ouve-se o grunhir de um porco e você sabe, no final o porco vai aparecer. Seria como no 'ser ou não ser' daquele sujeitinho, o Hamlet. esconder a caveira e mostrá-la no fim. Original paca, mas, enfim, tergiverso. A questão que me parece crucial, e falo para Lima, uma figura venerável, de velho para velho, é que despolitizar o festival, para prevalecer 'a arte', seria como despolitizar a vida, entregando as coisas à mão de Deus ou do Diabo, que, por sinal, anda solto. Como jurado, já me resignei a receber críticas por (talvez?) não ter estado à altura das exigências do momento. Mas, com o silêncio, em nome da arte?, não compactuo.

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