Foto do(a) blog

Uma geléia geral a partir do cinema

Casa monstro

PUBLICIDADE

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Não devia haver tanta gente na sessão de imprensa de Volver, de Pedro Almodóvar, na Mostra de Cinema, agora de manhã. Estava todo mundo na cabine da Paris para ver O Grito 2. O filme é produto dessa nova onda do terror japonês, que nem é mais tão nova assim, pois já vem durando alguns anos. O Grito é uma criação do diretor e roteirista Takeshi Simizu, devidamente incorporada por Hollywood - Sam Raimi produz Grito 2. O filme dura menos de 100 minutos que parecem mais de duas horas. Sou muito suscetível a sustos, a pular na poltrona e a ficar com o coração na mão. Desta vez, não tive nada disso e apenas fiquei olhando, sem muita emoção. Mas a gurizada (o público era predominantemente jovem) curtiu bastante. Há algo que me intriga e até fascina no terror japonês. Histórias de fantasmas fazem parte do imaginário daquela cultura. Existem fantasmas que vivem entre os mortais de Contos da Lua Vaga, de Kenzi Mizoguchi. Em Kwaidan, As Quatro Faces do Medo, de Masaki Kobayashi, um dos filmes mais plásticos da história do cinema, os fantasmas não são tão tranqüilos assim - enlouquecem os homens e provocam destruição. É interessante destacar que, nos anos 50, na fase imediatamente pós-bomba, os efeitos da radiação provocaram uma série de deformidades genéticas no cinema japonês. Foi quando surgiram os monstros tipo Godzilla e Mothra. No novo terror japonês, a relação é outra. Há uma combinação de projeção mental e medo físico. As pessoas temem o perigo representado pelos mortos, mas eles se materializam e agem fisicamente, mesmo que, às vezes, pareçam alucinações - a garota vê a menina assassina no vestiário, mas depois que ela sai de cena o plano filmado é do vestido com o xale preto que dá a impressão da cabeleira que envolve e asfixia as vítimas. O mais perturbador é que esse terror não permite redenção. Ela não existe em O Grito nem agora em O Grito 2. É um morticínio brutal, o que tem a ver com a representação do mundo atual. Aliás, se você comparar com Jogos Mortais, 1 e 2, a casa podre está sempre na origem de tudo. A casa assombrada de O Grito 2, o banheiro onde são atadas as derradeiras vítimas de Jogos Mortais 2. Que mundo é esse? É o mundo em que vivemos e que o terror expõe como um espelho deformado da realidade.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.