CANNES - O primeiro longa da competição, 'Sleeping Beauty', de Julie Leigh - nenhum parentesco com Mike -, é bizarro para se dizer o mínimo. Nada a ver com a Bela Adormecida dos contos de fada - quero dizer, nada literal. Aqui é uma garota que dlerta, não se sabe bem por quê, com o submundo. OK, a mãe era alcoólatra e dada a crises de violência, mas a diretora não vai por aí para tentar explçicar sua personagem. Aliás, ela não explica nada, o que, em princípio, seria atraente. A garota não age por dinheiro - numa cena, chega a queimar as notas que recebe por seu 'trabalho', que, na verdade, consiste na passividade total. Não é alienada, pois se preocupa com o amigo drogado que está morrendo. Essa 'ambivalência' a leva a entrar para uma irmandade secreta meio Kubrick, 'De Olhos bem Fechados'. Drogada e adormecida, fica à mercê de homens - todos muito velhos -, que podem fazer o que quiserem com ela, menos penetrar ou deixar marcas. Um dos malucos a queima com cigarro na cabeça, entre os cabelos. A ideia da vulnerabilidade é aterradora. Nossa bela dorme, acorda e é como se não tivesse acontecido nada, mas nós, o público, sabemos que houve. O problema é que o filme é feito num estilo deliberadamente 'anódino', talvez para passar o estranhamento. Confesso que, às vezes, tenho essa mesma sensação assistindo aos filmes teen de Gus Van Sant, que olha seus personagens com a frieza de um ontomologista. Estou falando dos recentes, porque os antigos, 'Drugstore Cowboy' e 'My Own Private Idaho', Garotos de Programa, eram muito melhores. Sei que Gus quer ser crítico, mas não me convence muito - daqui a pouco, na abertura de Un Certain Regard, 11 da manhã daqui, 6 horas no Brasil, ele mnostra 'Restless'. De novo jovens - o filho, Henry, de Dennis Hopper. Sei que misturei as coisas. Estou cheio de curiosidade por 'Restless' e sempre tenho a esperança de voltar a gostar de Gus Van Sant, mas sua fase atual me parece fake, é isso. Quanto ao filme de Julie, não gostei. Não me impressionou. Não foi um bom começo para a mostra competitiva, mas, com certeza, deve dialogar com outros filmes selecionados por Thierry Frémaux. Pode ser que, aí sim, faça sentido. Vamos aguardar.