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Uma geléia geral a partir do cinema

Afro-reggae no Oscar

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Há todo um cinema brasileiro voltado à discussão da cidadania e da inclusão social. No domingo, o Festival do Rio abrigou dois exemplos da tendência. À tarde, passou À Margem do Concreto, de Evaldo Mocarzel, que participa da mostra competitiva de documentários da Première Brasil 2006. À noite, fora de concurso, outro documentário, Nenhum Motivo Explica a Guerra, de Cacá Diegues e Rafael Dragaud. Evaldo trouxe de São Paulo o Gegê, que é uma importante liderança do movimento sem-teto. Conversei rapidinho com ele, que tomava um chope no Amarelinho, após a primeira exibição, e o Evaldo disse que queria filmar o Gegê, um sem-teto!, hospedado no Hotel Méridien, como convidado do festival. Após o samba (Noel, o Poeta da Vila) e o rap (Antônia), o filme do Cacá e do Rafael traz de novo a música para o cinema brasileiro (e o festival do Rio). Nenhum Motivo Explica a Guerra trata do grupo que criou o Afro-Reggae, usando a música para integrar a comunidade de Vigário Geral, liberando-a do estigma de violência associado ao arrastão de 1992. Mais do que um grupo de música, o Afro-Reggae desenvolve esse projeto de inclusão social que já virou modelo de exportação para todo o mundo. Nada de assistencialismo. O projeto investe na auto-estima como forma de resgatar a cidadania. Júnior, grande liderança, conta histórias maravilhosas, dele e de seus parceiros. Não tenho vergonha de dizer que chorei, no fim, quando o Júnior conta que carrega seus amigos mortos e os vê agora nesse monte de garotos que o projeto está ajudando a salvar. Júnior diz que não sabe como sobreviveu. Deveria ter morrido com eles. Os místicos dirão que sobreviveu porque tinha uma missão. É uma tragédia viscontiana. A mim, pelo menos, evoca Rocco e Seus Irmãos. Simone tem de ser sacrificado para que a família Parondi se una (e supere suas dificuldades). Nenhum Motivo Explica a Guerra é muito forte, mas talvez seja tradicional demais, até institucional, na feitura. Cacá e Dragaud não se preocuparam com a inovação de linguagem. Preferiram dar voz ao pessoal do Afro-Reggae. Pensei uma coisa. O Oscar não vai mudar nossa vida nem o cinema brasileiro, mas temos de ganhar um para desencantar. Se não der com Cinema, Aspirinas e Urubus, podemos tentar com Nenhum Motivo Explica a Guerra na categoria de documentário. É uma história de segunda chance, como a academia gosta. É uma história de inclusão social, como o Brasil necessita.

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