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Uma geléia geral a partir do cinema

A ponte de Desnoes (2)

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Gostei bastante de Edmundo Desnoes, ainda forte (e muito simpático) ao beirar os 80 anos (tem 78). O autor de 'Memórias do Subdesenvolvimento' vive nos EUA, tendo abandonado Cuba em 1980, porque, como disse, podia suportar a carência material, mas não a ausência de liberdade, quando a burocracia do Partido Comunista assumiu as diretrizes culturais da ilha de Fidel. Mas Desnoes não virou um contra e até diz, para quem gostaria de vê-lo condenar a Revolução Cubana, que significa alguma coisa o fato de o país ter resistido à queda do comunismo, ao embargo norte-americano e até à aposentadoria de Fidel. Desnoes tem consciência do fracasso do socialismo como experimento econômico em Cuba, mas não renunciou à utopia. Ele defende a abertura para o mercado e diz que deve vir acompanhada por mais liberdade cultural, pois é isso que Cuba pode oferecer de melhor ao mundo. Charutos, sim - os famosos 'cubanos -, açúcar e rum, mas principalmente cinema, música, ensino, medicina e profissionais qualificados, porque mesmo com toda dificuldade Cuba nunca deixou de investir na formação de seu pessoal. Desnoes permanece nos EUA, mas desde que voltou a Cuba em 2003 diz que se sente uma ponte entre dois mundos, e duas culturas. Achei linda a metáfora que ele construiu - uma ponte sob a qual 'las águas bajam turbias', que nem no título do mítico filme argentino de Hugo Del Carril, de 1951 (que ele me afirmou desconhecer). Desnoes é apaixonado pelo Brasil, que também não conhecia (embora 'Memórias Póstumas de Brás Cubas' tenha sido referência para a narrativa de 'Memórias do Subdesenvolvimento', ao qual se seguiu outro filme, 'Memórias do Desenvolvimento', que será filmado). Ele acredita no Brasil como país do futuro, como EUA, China, Índia e China, todos gigantes, todos continentais. Achei muito interessante o que ele disse. Cuba, nos anos 60, era um pequeno papis que se pensava grande, quando o Che exportava a revolução e Fidel enviava tropas à África. O Brasil, que teve as mesmas raízes africanas e a mesma influência do ciclo do açúcar, era um país que parecia conformado em ser pequeno. O desafio de Lula, segundo ele, é assumir o tamanho real do Brasil, não só as suas dimensões geográficas, mas o metafórico, deixando de ser o gigante deitado eternamente em berço esplêndido do nosso Hino Nacional. Sugiro que vocês dêem uma passada lá pelo Memorial da América Latina. Outros espaços estão exibindo o Festival do Cinema Latino, mas lá é o centro de tudo. E há uma moçada animada reciclando a geração 'poncho-e-conga'. Digo isso carinhosamente, sem qualquer conotação pejorativa.

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