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Mais uma noite de Natal

Por Estadão
Atualização:

Véspera de Natal. Toca a campainha. O tio entra com um saco de presentes e a tia carrega uma bandeja embrulhada com papel alumínio - dentro dela há um tender. Os dois filhos deles, de nove e dez anos, entram correndo e derrubam a filha dos donos da casa, de sete anos, que brinca sozinha com o presépio.

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A prima solteirona cumprimenta o casal e reclama de alguma coisa, mas ninguém ouve o quê. O irmão dela, também solteiro, elogia o vestido da tia e volta a comentar a novela com a dona da casa. Ninguém nunca disse nada, mas pelo jeito do primo todos sabem porque ele nunca se casou.

O dono da casa está na cozinha tentando abrir um maldito espumante, mas a rolha não quer sair de jeito nenhum. Ele perde a paciência e empurra a cortiça despedaçada para dentro da garrafa. Problema resolvido, ele grita o nome da mulher para que ela conte onde estão as taças de vinho empoeiradas há exatos 365 dias - desde o último Natal.

Em volta do presépio, as crianças perguntam por que Jesus não está lá; a dona da casa explica que ele 'vai nascer' à meia-noite. Eles aceitam a resposta e correm para a árvore de plástico verde cheia de luzinhas, onde os presentes descansam à espera da hora certa.

Quase meia-noite. Com honras de chefe de estado, o tender é levado para a mesa, onde se junta à maionese de atum e ao arroz com passas, uma receita da qual a prima solteirona se orgulha há anos e não dá para ninguém nem sob tortura.

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Os olhos da menina de sete anos já estão quase fechados, ela só agüenta porque quer conhecer Papai Noel. Os outros dois garotos não acreditam mais nisso; a desilusão veio há dois anos, quando pegaram o pai vestindo a tradicional roupa vermelha no banheiro.

O jantar está uma delícia. O dono da casa abre o terceiro espumante. A prima solteirona conta mais uma vez a história do amor não-correspondido pelo colega de trabalho; o tio também lembra mais uma vez dos tempos em que jogava futebol. "Se eu tivesse me dedicado mais, esse Natal seria na Europa", ele repete. Exatamente como no ano passado.

À meia-noite, todos se cumprimentam. Os dois garotos saltam em cima dos presentes, mas a menina de sete anos não resistiu e dormiu no sofá.

O ano que vem será igualzinho, com uma ou outra pequena mudança. A vida seguirá sem segredos, sem surpresas, como uma noite de Natal. Feliz Natal para todas as famílias do mundo: que sejamos sempre iguais, sempre diferentes. E sempre em frente, com muito amor.

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