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Um espaço para a discussão de ideias para nosso tempo

Lawrence Reed: "Este será um dos períodos mais feios de nossa história política"

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Por Estado da Arte
Atualização:

Há mais de 30 anos, o Instituto de Estudos Empresariais (IEE) vem se dedicando à inglória tarefa de defender os valores os princípios liberais em um país que, nas palavras do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, "não gosta de capitalismo". Nos dias 10 e 11 de abril, o IEE organiza em Porto Alegre a 30a edição do Fórum da Liberdade, o mais importante evento sobre o pensamento liberal do Brasil. Com a presença de nomes como Pedro Malan, Jeffrey Tucker, Eduardo Giannetti e Luiz Felipe Pondé, a edição comemorativa das três décadas de Fórum é toda voltada para o tem "o futuro da democracia", sublinhando a importância das dimensões políticas, e não meramente econômicas, para os os organizadores do evento. Não que falte economia: Lawrence Reed, economista e diretor presidente da FEE (Foundation for Economic Education), é outra presença confirmada do Fórum. Reed concedeu esta entrevista aos organizadores, e o Estado da Arte publica com exclusividade aqui no Estadão. 

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IEE: Como você avalia a situação econômica e o debate político nos Estados Unidos de Trump?Lawrence Reed: A situação econômica americana é, pelo menos para os próximos seis meses, em grande parte positiva. O mercado de ações parece estar sugerindo uma nova confiança na rentabilidade de curto prazo das empresas. O Federal Reserve (Banco Central americano) está aumentando as taxas de juros cautelosamente, a administração nova está prosseguindo com uma agenda pró-empreendedorismo, de desregulamentação, e procurando reduzir impostos, além de cortar despesas em determinadas áreas do orçamento federal. Para um cenário maior que seis meses, no entanto, é uma incógnita para todos. Muito será determinado pelo que acontecerá no comércio internacional. Se os EUA forem fortemente protecionistas, a recuperação irá diminuir e talvez até vire na outra direção. O debate político americano é volátil, refletindo a proximidade de votos da eleição recente, as fortes paixões de todos os lados e a própria personalidade do senhor Trump. A maioria republicana no Senado é estreita. Isso faz com que seja imprevisível o que vai acontecer no Congresso nos próximos seis meses. A esquerda estatista vê o que está acontecendo na nova administração como um ataque em grande escala a seus valores, de modo que o debate político certamente seguirá acalorado e desagradável. Quem pensou que teríamos um descanso das brigas políticas dos dois anos passados será surpreendido. Este será um dos períodos mais feios da nossa história política.

IEE: Como você caracteriza uma "mentalidade retrógrada" em economia e política? Como transformar essa mentalidade?

Lawrence Reed: Essa "mentalidade retrógrada" é caracterizada pelos seguintes sentimentos: 1) a resposta aos nossos problemas consiste em concentrar mais poder e dinheiro nas mãos dos políticos; 2) o governo pode gastar de forma inconsequente caso ele tenha ou não o dinheiro, porque podemos simplesmente executar déficits e deixar os custos para as gerações futuras; 3) podemos tributar e regular mais e mais o setor privado, e este ainda criará empregos e negócios; 4) tornar as pessoas dependentes de programas do governo em vez de incentivar soluções de sua própria iniciativa (tratando-as como animais de jardim zoológico) é, de alguma forma, bom para eles; 5) caráter pessoal é algo antiquado e realmente não importa, de todo modo. Creio que essas ideias devam ser combatidas de três maneiras: 1) eliminar os programas governamentais que encorajam tal pensamento; 2) educar um grande número de pessoas sobre os verdadeiros fatos econômicos da vida; 3) cada um de nós buscar o nosso auto-aperfeiçoamento e tentar o o nosso melhor para sermos bons exemplos para os outros.

IEE:  Como você percebe a situação no Brasil em relação a essa mentalidade?

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Lawrence Reed: O Brasil mostra alguns sinais de que está recobrando os sentidos e rejeitando essas idéias fracassadas e nocivas, mas tem muito trabalho a fazer. Quando os brasileiros, que estão indignados com o nível de corrupção e incompetência do governo, perceberem que a resposta é muito menos governo, e não simplesmente um governo diferente, então eles terão um progresso real.

IEE:Com a mudança de governo nos EUA, o que você acredita serem as políticas futuras do governo americano em relação ao Brasil?

Lawrence Reed: O governo Trump parece querer interferir menos nos assuntos de outros países e diminuir o envolvimento dos EUA como polícia mundial. Congratulo-o por isso. Por outro lado, a administração está promovendo um nacionalismo econômico muito preocupante, que poderia facilmente se tornar protecionista, o que prejudicaria o comércio com nossos parceiros comerciais, e o Brasil seria um grande afetado.

IEE: O que você indicaria para os atuais gestores públicos no Brasil? Quais são os primeiros passos no estabelecimento de mudanças econômicas e políticas em países como o Brasil?

Lawrence Reed: Os primeiros passos envolvem abraçar a livre iniciativa e o caráter pessoal como fonte de progresso econômico e uma rejeição da noção medieval de que o governo deve cuidar de nós e da economia. Reduzir os gastos públicos e os encargos sobre as pessoas que aceitam tomar risco empreendendo e retirar as bobagens marxistas das escolas e universidades.

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IEE:O Brasil, como todo país que vive uma crise econômica, tem abundantes oportunidades. Como os médios e pequenos empresários podem transformar essas oportunidades em resultados de valor?

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Lawrence Reed: Dado o tipo certo de ambiente político e econômico, em que as barreiras governamentais às empresas são drasticamente reduzidas, os empreendedores vão descobrir isso por si mesmos. Do contrário, eles saem do negócio. Ao utilizar seus pontos fortes, restringir seus custos, praticando bons princípios de gestão e procurando maneiras de servir os clientes melhor, eles vão produzir resultados de valor. Não temos que lhes dizer como, apenas temos que lhes dar o ambiente certo no qual eles são recompensados quando o fazem e penalizados quando não o fazem, e esse ambiente é a liberdade econômica.

IEE:  O Brasil voltou a flertar com alta inflação nos anos finais do governo do PT, e não foram poucos os economistas que negligenciaram esse problema por aqui. Como a alta inflação afeta a vida das empresas e dos cidadãos?

Lawrence Reed: Alta inflação encurta horizontes de todos os tempos, porque torna o futuro muito mais difícil de antecipar. Isso nos leva a evitar investimentos a longo prazo e a buscar ganhos a curto prazo, por vezes passageiros. Uma economia saudável precisa exatamente do oposto: uma moeda sólida que incentive todos a planejar para o longo prazo. A solução para a inflação é simples. É não inflar. Inflação é um fenômeno monetário, se os preços estão subindo rapidamente e em toda as direções, é invariavelmente por causa da má política monetária pelo governo. Muitas vezes, esse é o resultado direto da má política fiscal: o governo gasta demais e pressiona-se a imprimir dinheiro para pagar seus gastos excessivos. É necessário cortar gastos, equilibrar o orçamento e bloquear a impressora da casa da moeda. Em termos gerais, é simples assim.

IEE: Quais são os principais obstáculos que os países pobres enfrentam para enriquecer?

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Lawrence Reed: Em primeiro lugar, a corrupção, que surge previsivelmente de muito poder e dinheiro nas mãos do governo; segundo, uma mentalidade socialista que vê lucro e empreendedorismo como vacas a serem açoitadas ou ordenhadas em vez de serem deixadas sozinhas para crescer. Por fim, uma ética pessoal subdesenvolvida acerca do respeito pela vida e da propriedade de outras pessoas sob o Estado de Direito.

 

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