Se é assim, por que os cortes? Alguma pessoas, inclusive cientistas, podem cair na tentação de acreditar que os cortes decorrem de uma opção de governo: condenar o Brasil a uma eterna dependência, ou coisa parecida. Pelo que observo, quanto o mais o comentarista é ou foi atraído pela esdrúxula tese segundo a qual o atual governo resulta de um golpe de estado, maior a probabilidade da adesão a tal hipótese. Não creio nisso, talvez por não crer que tenha havido um golpe. De resto, pelo que sei de ajustes fiscais, governos só os fazem quando não têm outra opção, e uma vez que começa o ajuste os cortes são feitos onde é possível. Infelizmente, na categoria do que é possível, encontram-se os investimentos em geral e os investimentos em ciência e tecnologia em particular.
A lógica é simples, quase rasteira, quando percebem que a situação financeira do governo está insustentável alguns governantes tendem a empurrar com a barriga até que outro assuma o cargo e tenha que fazer os cortes. Outros ignoram o problema até conseguir se reeleger na crença que o eleitor saberá perdoar, no caso de Dilma, um caso extremo, foram usados diversos artifícios para não reconhecer o problema fiscal, inclusive as fraudes contábeis que acabaram por tirá-la do cargo. Quanto mais tempo dura a enganação, mais brutal e desastrado será o ajuste. No caso do Brasil demorou demais, e, por isso, o ajuste fiscal que começou ainda em 2014, logo após as eleições, foi tão destrambelhado. Quando o ajuste se impõe não é fácil encontrar onde cortar gastos, várias pessoas foram contratadas e não podem ser demitidas nem ter seus salários reduzidos, várias outras despesas são reguladas por lei e exigem reformas na lei ou mesmo na Constituição para serem cortadas, alguns programas têm forte apelo social e político, e por aí vai, de forma que acaba sobrando para o investimento e para algumas despesas correntes discricionárias. Por isso Dilma, entre 2014 e 2016, e depois Temer, em 2016 e 2017, fizeram cortes em vários setores que o senso comum e os especialistas dizem não ser o melhor lugar para fazer cortes. É nesse sentido queé preciso pressionar permanentemente o governo por cortes, pois se ficar por conta dos políticos, os cortes sempre serão adiados e quando forem inevitáveis serão feitos sem critérios mais sofisticados do que o "corta onde dá para cortar".
Como todo argumento lógico, o meu é tão bom quanto a boa vontade que o leitor me oferece, por isso resolvi olhar os dados. No sistema SIGRA/IBGE estão os dados de investimento em pesquisa e desenvolvimento como proporção do PIB (link
aqui). Infelizmente, os dados só vão até 2014, ou seja, deixam de fora a maior parte do ajuste fiscal, mas mesmo assim é possível tirar algumas conclusões. A figura abaixo mostra o investimento federal em ciência e tecnologia entre 2000 e 2014. Dois fatos chamam atenção: o aumento drástico em 2013 e a queda em 2014.