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Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

'Todo personagem é difícil, ainda mais no começo. Dá um desespero...'

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Por Sonia Racy
Atualização:

 

 Foto: Paulo Giandalia/Estadão

Ator relata experiência de filmar no deserto de Atacama, sua preparação para fazer um filme falado em espanhol e a curtição de tantas viagens de carro pelo mundo 

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O espírito aventureiro e viajante de Daniel de Oliveira contribuiu para lhe dar mais gás na hora de encarnar o personagem Antônio no longa Romance Policial, de Jorge Durán, que estreia dia 4 junho. Na história, o escritor viaja ao deserto de Atacama, no Chile, em busca de inspiração. Na vida real, o ator ficou fascinado com a ideia de passar dois meses no local. "Foi irrecusável", disse, em entrevista à coluna. A preparação para o filme - uma coprodução Brasil-Chile - incluiu uma temporada em Buenos Aires para afinar o espanhol e algumas viagens no entorno. Relembrando as filmagens, o ator detalhou sua experiência ao subir o vulcão Cerro Toco e a brincadeira de trocar uma camiseta do Flamengo - que seu personagem usaria - por uma do Atlético Mineiro, time do qual é torcedor.

Na conversa, ele comentou também o enorme desafio que foi fazer o protagonista em Cazuza - O Tempo Não Para, em 2004. "Todo personagem é difícil, ainda mais no começo. Dá um desespero... No caso do Cazuza foi muito difícil, porque todo mundo tem uma referência visual muito forte dele...".

Integrante do primeiro escalão da Globo e xodó dos diretores de cinema, Daniel está entre os atores mais prestigiados do País. No entanto, não pensa em carreira internacional: "Estou fazendo muita coisa boa e pegar uma língua diferente é difícil". Tampouco se considera um workaholic: "Trabalho muito, mas tenho tempo de ficar com meus filhos, estudando, de pernas pro ar, fazendo minhas lutas, as coisas de que eu gosto", conta o ator, praticante de jiu-jitsu e da luta israelense krav magá. Abaixo, os melhores trechos da entrevista.

Como pintou a oportunidade de fazer um romance policial? Foi um convite do Jorge Durán. Ele é um mestre. E veio com essa história do Atacama... Imagine só. Você poder filmar e ficar no deserto por dois meses... Foi irrecusável.

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Já tinha ido antes ao lugar? Nunca tinha ido nem para o Chile. Achei um dos lugares mais bonitos do planeta. Quando cheguei, os produtores disseram que o Jorge tinha sofrido um acidente de bicicleta. Então, encontrei-me com ele - e sua cara estava toda esfolada. Depois ele ainda torceu o pé, mas continuou acelerado. Admirei ainda mais o cara, que estava com um supergás para fazer o filme. Parecia que era o primeiro longa dele.

O fato de ele ser chileno criava uma relação diferente com o deserto? Lógico. É a volta do filho para a pátria. Isso passa para a equipe, que estava muito coesa em torno da tarefa. Foi incrível ficar sendo alimentado pelas histórias de vida dele.

Você passou por Buenos Aires para preparar seu espanhol? Sim. Fui de carro. Gosto de dirigir. Já fui de carro duas vezes para Buenos Aires. Quando fiz Órfãos do Eldorado, fui de carro para Belém e agora vou fazer NY- Los Angeles. Como eu queria aprender mais um pouco de espanhol para o filme, peguei a família e ficamos dois meses lá. É louco isso, porque cada filme e cada diretor nos leva para um lugar né? O Jorge Durán, por exemplo, me levou pra cima de um vulcão.

Como foi isso? Ele disse que não ia, mas, se eu quisesse, poderia ir. Então, fomos eu, o fotógrafo e um câmera. Era domingo, um dia de folga. A gente subiu o Cerro Toco, no Atacama. Você imagina, né? Quando cheguei lá, beijei a bandeira do Chile (risos). A cada passo lembrava dos meus filhos. Era um passo para o Raul e um passo para o Moisés. Estava frio, ventava, sentia uma dor de cabeça. E o filme começa com essa subida. Comprei um poncho que o cara falou que não daria pra subir. Eu falei: "Leva sim, é bonito e eu quero usar" (risos). Subimos um dando força para o outro, porque foi custoso. Mas, chegando lá, as cores eram maravilhosas. Isso fica na memória da gente para sempre.

Você foi muito elogiado pelo papel de Cazuza, em 2004. É mais difícil interpretar um personagem que existiu de verdade? Todo personagem é difícil, principalmente no começo. Dá um desespero... No caso do Cazuza foi muito difícil, porque todo mundo tem uma referência visual muito forte dele. Ele está no YouTube, sua voz na rádio... Então foi difícil.

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Na época do filme não houve polêmica quanto a beijo gay? Houve sim, mas foi menos do que estamos assistindo agora. O que me parece é que estamos dando um passo para trás socialmente. O Brasil é tão diversificado, mas está tão careta, retrógrado. Não podemos deixar, não. As pessoas têm que aprender a respeitar. Saber que o amor está acima de tudo, entender as diferenças. Se a pessoa ficar estressada com a religião ou opção sexual do outro, vai morrer estressada, porque é a diversidade que faz a sociedade.

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Voltando à sua experiência no deserto, tem uma história de bastidor envolvendo a camisa do Atlético Mineiro... É o seguinte: o personagem do filme tinha uma camiseta do Flamengo. E eu, desde o primeiro momento, pensei: "Ai, meu Deus, essa camisa aí não vai rolar"... Mas eu queria o papel e já tinha feito no Zuzu Angel uma cena com a camisa do Flamengo, porque o Stuart Angel Jones era remador do clube. Então, levei duas camisetas do Galo e, no dia da cena, escondi a do Flamengo. Todo mundo ficou procurando. Aí disse ao Jorge, com as camisas do Galo na mão: "Você tem duas opções: a preta e branca ou a branca e preta" (risos).

É torcedor roxo do Galo? Sou, e o vejo sempre porque o Galo tem que ver. Levei os meus meninos ao Mineirão, eles entraram em campo...

Acha que vivemos um momento triste de violência nos estádios entre as torcidas? Isso é pavoroso. Sempre existiu, mas agora está pior. Não podemos perder nunca a cultura de levar nossos filhos ao estádio. (A violência) É uma ignorância da nossa sociedade autodestrutiva e extremamente violenta. Temos que consertar isso, porque, senão, estaremos fracassando como espécie.

O que você tem de mineiro? Ué, praticamente tudo!! (risos). Nasci lá, fui criado lá. Agora fui fazer um "pacote geral". Levei os meus meninos para a Gruta do Maquiné, que é um lugar da minha infância. Cheguei lá e estava fechado, mas a mulher da lanchonete ligou para o primo e abriu. Só em Minas Gerais acontece isso. No outro dia fui a Inhotim. Já tinha ido e quero voltar para levar a Sophie (Charlotte), que quer ir. E, no outro dia... Galo!

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Você fala muito dos seus filhos. De que modo a paternidade mudou a sua vida? Para melhor! Eles são muito bacanas, parceiros, bem humorados. Não vivo sem os filhos. Não entendo como tem pai que renega, bate, vemos tanta violência com criança... Isso me deixa revoltado porque ser pai é um negócio bom demais.

Você disse ter votado em Dilma em 2010. E em 2014? Votei nela de novo.

Como vê hoje o governo? Agora estamos vivendo um impasse. Estamos em um país democrático, ela foi eleita e estamos vendo o que está acontecendo. É muito complicado, porque o País é corrupto na raiz, desde o pequeno poder até lá nos cargos mais altos . A corrupção não é uma coisa centralizada, de um lugar só. Meu avô - que era contador - já dizia que, se fizessem uma vistoria, o bicho ia pegar. / MARILIA NEUSTEIN

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