O fato de o Partido Comunista da China ter anunciado domingo sua intenção de acabar com o limite de dois mandatos presidenciais inscrito na Constituição do país, não abalou o ativista, artista e diretor Ai Weiwei. A alteração abre caminho para que o presidente Xi Jinping permaneça no poder, em Pequim, por tanto tempo quanto queira.
Em conversa com a coluna, durante jantar oferecido anteontem por Flavia e Rodrigo Terpins - para sócios da Associação Amigos Brasileiros do Israel Museum- Weiwei mostrou-se indiferente às manchetes dos jornais, nos últimos dias, sobre a nova regra do jogo.
Seria este um sinal de que a China está retrocedendo, numa eventual intenção de instalar, no futuro, algo parecido com um regime democrático? "O que fizeram foi tirar o cobertor fino que paira sobre uma falsa abertura. Eles vão mudar a Constituição para dar uma aparência melhor ao que já tinham decidido fazer", diz o ativista - que ficou preso durante 81 dias por falar o que pensa. E que ainda teve o passaporte confiscado e os estúdios duas vezes invadidos. "Foram eles que me fizeram famoso", ironiza.
O ativista-diretor não nutre lá muita esperança de que o atual quadro se altere. O mundo, diz ele, jamais vai reagir à China ou ao que ela possa fazer contra os direitos humanos, em matéria de arbitrariedade interna ou de violência contra cidadãos. "Eles não precisam mudar. São economicamente muito fortes e os países de Primeiro Mundo que poderiam se manifestar, como Estados Unidos e França, continuarão a respeitá-la e a negociar com ela."
Como um ícone da "resistência", sente-se seguro em suas viagens pelo mundo? "Não". Mas, em sua condição de dissidente, sabidamente perseguido pelo regime, não haveria um risco de o governo Xi Jinping fazer algo contra você? "Meus dois advogados estão presos, vários colegas meus estão presos e outros simplesmente desapareceram....", revela. Em suma: o artista acha que corre perigo, sim.
Acompanhado de Marcello Dantas, curador e diretor de programação da Japan House, Weiwei não escondeu seu encantamento com a quantidade de mulheres convidadas. "Na China só seriam homens", brincou. Contou ali sua história sobre sua exposição no Israel Museum - Maybe, Maybe Not.
Há dois meses ele trabalha na Bahia, em obra destinada à exposição que inaugura em outubro na Oca. "Será a maior da minha vida, o equivalente a cinco exposições em museus. E será curada pelo Marcello". Para a missão, ele trouxe 25 funcionários e vai usar matéria-prima brasileira. Viajou pelo Amazonas, Vale de Jequitinhonha e parou na Bahia. Lá, conseguiu um estúdio emprestado de um artista brasileiro que trabalha com madeira. Fácil trabalhar com os baianos? "Percebi que eles trabalham melhor de manhã e de noite. De dia, nem eu consigo..."
Weiwei não fica na Bahia mais de uma semana por mês. Serão, ao todo, nove meses para que a exposição, brasileiríssima, venha à luz.