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Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

'Comédia é uma maneira diferente de lidar com o próprio drama'

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Por Sonia Racy
Atualização:

 Foto: Andre Wanderley

A Tina de Sangue Bom fala sobre a escassez de bons roteiristas, o sucesso na TV, poder feminino e o que mudou depois que teve sua filha: "Ela me salvou!"

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Ingrid Guimarães está no auge de sua carreira. Aos 40 anos, a atriz, roteirista, diretora, apresentadora - e o que mais precisar - consegue conciliar a carreira com a vida conjugal e a maternidade. Casada com o designer e publicitário Renê Machado, a goiana radicada no Rio é mãe de Clara, de 3 anos.

Ela parece estar em todos os lugares. Apresenta, no canal GNT, o programa Mulheres Possíveis - também escrito por ela - e vive a "louca do bem" Tina na nova novela das 7 da Globo, Sangue Bom. E no teatro, está em cartaz com Razões Para Ser Bonita, agora em temporada paulistana.

Pois justamente o malabarismo que as mulheres modernas enfrentam foi tema de seu maior sucesso no cinema, o filme De Pernas Para o Ar 2, visto por mais de 4 milhões de pessoas. "É um roteiro que não fala só de mim, mas da minha geração", conta. Alice, vivida por Ingrid, é uma workaholic assumida. Mas, diferentemente da atriz, a protagonista tem sérias dificuldades em lidar com o marido e o filho.

Conhecida por seu lado comediante, Ingrid garante: não é engraçada 24 horas por dia. "Acho chato as pessoas ficarem olhando e esperando isso." Pelo contrário. Para ela, só com muita seriedade é possível administrar sua vida para lá de atribulada.

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A seguir, os principais trechos da conversa.

Você sempre foi engraçada?

Eu não sou aquela pessoa que faz gracinha em qualquer lugar. Até acho chato as pessoas ficarem olhando e esperando que vocês seja engraçada 24 horas por dia. Como sou uma comediante autoral - escrevo, produzo, dirijo -, tento ser sempre muito séria para conseguir administrar essa empresa da qual eu fiz a minha vida. Acho que sempre tive uma visão diferente da vida. Isso é fazer comédia. Comédia é uma maneira diferente de lidar com o próprio drama.

O Brasil ainda está carente de boas comédia?

É importante o Brasil ter uma indústria com todos os tipos de filme, assim como é nos EUA. Devíamos nos unir em vez de criticar. Fazemos poucos filmes, mas estamos melhorando. São poucos os roteiristas bons de comédia, ainda não temos indústria para isso. Estamos nos formando, mas vamos no caminho certo.

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Você já fez ou faz análise?

Estou há 12 anos com a mesma terapeuta. Acho essencial para sobreviver, nesta profissão, com saúde mental.

Como você consegue conciliar maternidade e vida profissional?

Não gravo muito. Nos dias de folga, faço todas as atividades com a Clara. Nos fins de semana, venho com ela para São Paulo, passeio, levo ao teatro. Ela adora! Sou mãe canguru, levo meu "pacotinho" sempre comigo.

Você se identifica com a Alice, protagonista do filme De Pernas Para o Ar 2?

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Sim, acho que é um roteiro que não fala só de mim, mas da minha geração. Já vivi diversas cenas do filme. Mas claro que, por ser uma comédia, tem sempre uma crítica a ser feita da realidade.

O que mudou na sua carreira depois de ser mãe?

As prioridades. Hoje em dia, faço menos coisas para mim e mais para a Clara. Era muito workaholic antes de ter minha filha. Acho que ela me salvou dessa coisa Alice (risos).

Você já sofreu alguma frustração no trabalho?

Já, claro, isso é normal, todo mundo passa. Mas tive muita sorte e muitos sucessos na minha vida profissional, principalmente no teatro. Então, quando a noite era frustrante, a próxima era melhor. No balanço, tive mais coisas boas do que ruins na carreira.

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A mulher bem-sucedida tem dificuldades para se relacionar?

As mulheres estão, cada vez mais, tomando as rédeas das próprias vidas. E quanto mais responsabilidade adquirem, mais poder elas têm. Isso acaba, de certa maneira, masculinizando a mulher. Eu mesma, às vezes, me vejo muito mandona, masculina. A gente vai se afastando um pouco da nossa feminilidade. Quanto mais sucesso e poder, mais a gente tem responsabilidades e mais macho fica (risos). Quando falo de feminilidade, incluo um monte de coisas, como o prazer sexual. Nós não somos como os homens, precisamos de um tempo não só para amar, mas para se cuidar, se curtir.

Você já disse que acha a sociedade muito machista.

O que quis dizer é que é muito mais difícil, como mulher, protagonizar uma comédia sobre sexo - do que se fosse homem. Quando os homens sentam num bar e falam baixaria, ninguém julga ou se assusta. Já quando uma mulher fala palavrão, pode assustar o público. O Brasil ainda é um país muito conservador e machista, sim, mas, nessa entrevista, estava me referindo ao humor.

Como é sua personagem Tina, da novela Sangue Bom?

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É uma mulher bem maluca, uma louca do bem, digamos assim. Já fez todo o tipo de terapia, religião, vive numa outra realidade. Se eu fosse abandonada no altar, como ela, partiria pra outra. Mas talvez não tivesse coragem de entrar numa igreja novamente.

Que personagens foram mais marcantes na sua carreira?

Na primeira peça de teatro que eu escrevi e em que atuei, Confissões de Adolescente, interpretava uma menina que fumava maconha. Foi meu primeiro personagem marcante. A peça foi um grande sucesso nos anos 90, abriu diálogo entre pais e filhos para falar sobre tabus como drogas e aborto. Até hoje me param na rua. Tem a Pitty (do seriado Sob Nova Direção, da Globo), meu primeiro personagem na TV. Mas as pessoas se lembram mais é da Leandra Borges (top model que Ingrid interpretava no Fantástico).

Você se inspirou na Gisele Bündchen para fazer a Leandra Borges?

Não. A Leandra já existia no Cócegas. Quando criei a personagem, a anorexia era um tema que estava no auge. Fiz uma sátira. Aí apareceu a Gisele, para salvar a magreza. Era uma modelo que, de certa maneira, tinha bunda, peito. No final, acabei fazendo uma homenagem a ela.

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Cócegas durou 11 anos e foi um grande sucesso. Que memórias tem dessa época?

Mudou a minha vida profissional, me deu independência financeira e abriu as portas para a TV. Costumo brincar que eu saí pela porta dos fundos e entrei pela porta da frente depois de Cócegas.

Você está em turnê com a peça Razões Para Ser Bonita. Esse tema mexe com você?

Sempre me intrigou, principalmente depois que tive a minha filha. Pensei: se hoje em dia as meninas estão se preocupando cada vez mais cedo com a aparência, imagine quando ela for adolescente. Em parte, isso é culpa dessa superexposição que o Facebook, o Instagram trouxeram. Isso acabou escravizando as mulheres. As meninas perdem um tempão alisando o cabelo, se preocupando em ficar magras e viram pessoas desinteressantes. É caso de saúde pública.

É vaidosa?

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Sou de uma família de mulheres - somos três filhas e cinco netas. Não tem como não ser vaidosa. Mas considero minha vaidade na medida certa, voltada para o meu trabalho. Graças a Deus, tenho uma genética muito boa, quase não engordo. /SOFIA PATSCH

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